Subindo A Linha

A Seleção joga hoje

Na foto, Pelé, com 17 anos chora nos ombros de Didi, então com 28. Ao lado deles, estão Gilmar, 27, e Orlando, 22. Didi e Pelé foram escolhidos os melhores jogadores daquela edição.

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Por Vinicius Prado Januzzi

 

Hoje começam as eliminatórias da Copa do Mundo de 2018. Daqui até o Mundial da Rússia serão 18 rodadas para decidir quem serão os times que preencherão as 4 vagas diretas destinadas às seleções sul-americanas, além da vaga adicional possível ao quinto colocado por meio da repescagem.

O formato já é conhecido de todos nós. 10 equipes se enfrentam em dois turnos, com o saldo final de 18 rodadas e classificação determinada por pontos corridos. Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Equador, Paraguai, Peru, Uruguai e Venezuela, filiados à Conmebol, são os concorrentes.

Não são, no entanto, só essas as informações que nos interessam. Acima de tudo, a nós, que acompanhamos o futebol dia a dia e mesmo nós que não o vemos quase nunca, interessa uma Seleção Brasileira hegemônica e que seja farol tático e técnico para as demais. Tudo que nesse momento, infelizmente, não pode nos ser oferecido.

Com Dunga, imagino ser difícil, senão impossível, não nos classificarmos para a Copa do Mundo. O jogo do treinador brasileiro é focado e extremamente competitivo. Em curto prazo. Desde que estreou novamente na equipe, o time não perdeu e, em geral, portou-se bem. Dunga pensa partida a partida como se fossem as derradeiras para o time. Arrisca-se pouco e monta taticamente o Brasil de forma conservadora, fortalecendo a defesa e valorizando o contra-ataque como principal recurso ofensivo.

Essa estratégia não é necessariamente ruim. Existem times e times, modos e modos de jogar. Por mais que sejamos quase todos esperançosos de ver equipes brilhantes, que deem mais valor ao talento que à botina, mais liberdade ao drible que ao ferrolho defensivo, é preciso reconhecer que, no mais das vezes, times bem postados e não necessariamente brilhantes conseguem alguns resultados.

Dito isso, acredito fielmente na capacidade de Dunga em comandar o time para a classificação. Entretanto, a um custo enorme, o custo da fuga para frente. Que o Brasil pode ganhar todos os jogos há poucas dúvidas. Que podemos nos sobrepor à boa parte dos adversários há mais questionamentos, ainda que esse seja mais ou menos o desenrolar das coisas. Isso tudo com um jogo de extrema marcação, reforçada pela velocidade de meias e atacantes e pela habilidade descomunal de Neymar.

Não fica daí nenhuma lição para o futebol brasileiro. Em geral, argumenta-se, Dunga entre eles, que no Brasil a expectativa por vitórias é maior do que a de bons jogos e inovações futebolísticas. Esquecemos todos que não são, entretanto, escolhas mutuamente excludentes e que é possível ao Brasil, com os jogadores que tem, fazer muito bem todas essas coisas. Sem exceção.

Convocar Kaká, Ricardo Oliveira e Elias certamente não contribui muito nesse sentido para que possamos evoluir em termos técnicos e para que possamos construir domínio em relação ao futebol mundial. Ambos são ótimos jogadores, mas nesse momento pouco acrescentam. Pelas suas idades, dificilmente estarão na Copa; podem ser substituídos tranquilamente por outros jogadores de igual ou maior potencial, de igual ou maior experiência em termos de participação em campeonatos fortes e em clubes de grande porte. Que o Brasil precisa mesclar novos talentos com outros mais consolidados, é inegável, o que não significa fazer da idade sinônimo único de maturidade e, sobretudo, fazer da experiência o artífice principal para a construção de uma equipe.

Desde a Copa de 2006 até à última, o discurso mais ou menos corrente é esse, no fim das contas. Precisamos de jogadores tarimbados (maior jargão do futebol impossível) para enfrentar as grandes seleções do mundo; a geração é boa, mas nem se compara às de outrora. Concordo em gênero, mas não em número e grau. O argumento da qualidade individual e das cicatrizes da vida é válido até determinado ponto. No nosso caso, porém, serve brilhantemente para ocultar seleções arrogantes, treinadas arcaicamente e sem perspectivas que não as mais simplórias e perdedoras em longo prazo no futebol.

Na Copa da Alemanha, não foi a bagunça que eram os treinamentos que mais nos prejudicou. Em 2010, não foi o ferrolho contra-midiático tampouco a lesão de Elano que nos custou a derrota contra a Holanda. Em 2014, não foi um só jogo ruim que fizemos nem poucos lances que definiram a catástrofe no Mineirão no inesquecível 8 de Julho de 2014, dia internacional da chacota. Em todas essas oportunidades, o que faltou mesmo ao Brasil foi propor o jogo, armar-se técnica e taticamente de modo ofensivo e organizado, com aproveitamento consciente tanto das incontestáveis capacidades de marcação de nossos jogadores quando da habilidade fora do comum da maioria dos selecionados.

A meu ver, sabendo o quanto tal argumento pode soar herege, os jogadores brasileiros não são piores que os da Alemanha e que os da Espanha, últimos campeões mundiais. Não somos piores que a Argentina, a Holanda e a França. Não somos, entretanto, melhores que México, Chile, Inglaterra e Portugal, guardadas as devidas peculiaridades de cada seleção e as diferenças de qualidade entre elas. Individualmente, peça por peça, estamos bem servidos, obrigado.

Falta mesmo ao Brasil um time que ouse organizadamente, imponha-se com estratégia e habilidade. Não acho que jogar para frente tenha efeitos positivos imediatos, como que por relação unívoca de causalidade. Agora, pensando na organização brasileira em relação ao futebol, no legado de anos e décadas e no processo de formação de jogadores, jogar como joga atualmente a seleção é um pecado esportivo e político dos mais cruéis. Infelizmente.

Sugiro aqui, como parte do que afirmo, que assistam à final da Copa do Mundo de 1958, entre Brasil e Suécia (https://www.youtube.com/watch?v=kjWe7ATSjPU). O Brasil contava com Pelé, Gilmar Santos, Garrincha, Zagallo, Djalma Santos, Vavá e outros colossos de nosso futebol. Ainda assim, engana-se que só vencemos aquela Copa por esses talentos extraordinários. O modo pelo qual a equipe jogou naquele 29 de junho em Estocolmo, agressivo coletivamente, com participação direta de todos os jogadores na marcação e no ataque, foi o mais decisivo. Fosse o Brasil só um misto descompassado de grandes talentos talvez tivesse tido pior sorte. Assim fomos em 2006, em menor medida em 2014 e em bem menor medida em 2010.

O Brasil está, enfim, entre os mais bem servidos do mundo em relação aos jogadores que podem vestir a camisa de seleção principal. Não somos a Súecia de Ibrahimovic, o País de Gales de Bale ou o Peru de Guerrero. Temos talentos aos montes, tristemente direcionados ao jogo feio e não propositivo, ao vigor defensivo de Felipão e Cia e não à volúpia de Guardiola e Sampaoli. Somos uma equipe uniformemente habilidosa, com a exceção de Neymar e uniformemente treinada para a vitória acima de tudo, contra todos e contra ninguém e, principalmente, contra si mesma.

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