Grita Torcedora: Queremos mais futebol feminino!

Tathiana Abreu

Durante muito tempo eu acreditei não gostar de futebol. Os motivos eram muitos: não sou uma pessoa competitiva, não me interesso por esportes, prefiro fazer outras coisas com o meu tempo, as torcidas são muito hostis e violentas. Acontece que, ultimamente, venho descobrindo que muito do que eu coloquei pra mim como o que eu gosto ou não gosto não fui eu quem decidiu. Cada um desses motivos elencados para justificar minha falta de interesse pelo futebol tem um outro motivo mais profundo por trás.

Por exemplo, o fato de eu não ser uma pessoa efetivamente competitiva não necessariamente significa que eu não seja capaz de me envolver ou torcer em alguma situação que eu veja meu país (ou meu time) se esforçando para conquistar algo, não tenho sangue frio para não me envolver em um grito de alegria ao ver um grupo que eu admiro e que me representa chegar a uma vitória… e é aí que entra a raiz da questão. O futebol nunca foi algo que me tocou pessoalmente porque nunca me senti representada por ele. Pelo contrário, todos os mecanismos do futebol são voltados a ter homens como protagonistas, desde o campo até as torcidas. Eu, sem saber, internalizava: o futebol não é para você, não seja inconveniente, não seja intrometida, lugar de mulher é assistindo novela (ou séries, ou comédias românticas).

Na televisão, todos aqueles longos programas em que se discute as minúcias das partidas de futebol mais recentes, em que se fala sobre tudo desde o cabelo do Neymar até as últimas peripécias do Messi, é muito difícil encontrarmos alguma comentarista mulher, quando existem mulheres nesse tipo de programa geralmente estão em minoria (é comum ver uma mulher sozinha entre vários homens), são jovens, bonitas, padronizadas. Não que uma mulher dentro dos padrões não possa gostar de futebol e opinar bem sobre, mas ninguém ali está interessado em suas opiniões (salvo algumas exceções que podem vir a existir), ou seja, mesmo quando “aceitas” naqueles ambientes as mulheres são intimidadas e constantemente silenciadas. Estão em posição secundária, estão ali para serem decorativas, sorridentes e agradáveis, mediarem discussões nas quais não estão envolvidas, mesmo que por vezes tenham algo a contribuir.

Nos campos a atenção é voltada exclusivamente para times e seleções masculinas, muitas vezes a associação entre atleta que joga futebol e homem é implícita, não é necessário explicar que você vai assistir um jogo da seleção masculina. Basta apenas dizer que vai assistir a seleção. Maior prova disso é que hoje acontecem, simultaneamente, dois eventos de futebol: a copa américa de futebol masculino e a copa do mundo de futebol feminino. E o que se discute nas mesas de bar e nas filas do pão não é, em sua maioria, o desempenho, até agora exemplar, da seleção feminina, e sim a atuação, não tão exemplar assim, da seleção masculina na copa américa.

Decidi fazer um experimento e tentar acompanhar todos os jogos femininos que eu puder, tratando o evento com a mesma importância com a qual foi tratada a copa do mundo de futebol masculino ano passado. Confesso que a experiência têm sido um pouco frustrante, é bem mais satisfatório se sentir empolgada com algo quando o resto do Brasil está igualmente empolgado, é mais provável ficar feliz com uma vitória do time brasileiro se essa vitória garante que seu expediente ou horário de aula será reduzido para que você possa acompanhar os jogos. Mas, ainda assim, em questão de qualidade, força de vontade (mesmo sob condições adversas http://www.ladobi.com/2015/06/grama-sintetica-copa-futebol-feminino/), a seleção das meninas não deixa nada a desejar, pelo menos na humilde opinião de alguém que acompanha o futebol bem esporadicamente! Os jogos são empolgantes sim, e, pessoalmente, percebi que é bem legal ter a experiência de olhar a tv e ver mulheres fazendo bonito em um esporte que não é considerado feminino, pelo simples motivo de alguém ter decidido isso a muito tempo atrás!

Os desafios das atletas do futebol feminino são muitos, se dedicar a ser uma jogadora profissional de futebol não garante os privilégios, dinheiro e glamour que um jogador de futebol bem sucedido tem. Pelo contrário, é uma demonstração de coragem se propor a desempenhar uma profissão que não vai necessariamente te garantir estabilidade financeira e um futuro confortável para além dos campos (http://www1.folha.uol.com.br/esporte/2015/05/1630038-ex-capita-da-selecao-brasileira-vira-motorista-de-onibus-no-rio-de-janeiro.shtml), mas essas mulheres existem, e estão ai para provar que, contra tudo e todos, são merecedoras de reconhecimento.

A intenção aqui não é ir contra a cultura do futebol masculino, não repudio nem julgo quem gosta do esporte em sua forma mais divulgada, afinal, a grande paixão nacional é paixão por um motivo. Longe de mim querer  policiar o que cada um gosta e dizer o que deve ou não fazer as pessoas felizes. Eu mesma de vez em quando me arrisco a assistir um jogo ou outro, tenho amigos, família e namorado, pessoas que admiro que têm o futebol como uma parte importante de suas vidas. E isso desperta sim o meu interesse, principalmente depois que descobri que é possível tentar lutar pelo meu espaço naquele ambiente e me sentir mais confortável dentro dele.

Enfim. Acho que o que tentei dizer aqui foi: não acho que mulheres devam necessariamente assistir somente partidas de futebol feminino, mas seria bom ter a opção!

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