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Ao leitor: Sejamos bem-vindos de volta

Após quase dois anos de hiato, é com imenso prazer que podemos dizer: “estamos de volta”.

O Subindo a Linha começou como um projeto de amigos de faculdade de Jornalismo e Educação Física para falar sobre futebol e questões sociais. Em 2015, ano em que estivemos ativos, produzimos, discutimos, agregamos amigos de Ciência Política, Audiovisual e fomos construindo a identidade que temos hoje.

O tempo em que demos pausa na produção se deve, principalmente, à concentração na vida acadêmica. TCC’s, ocupações, candidatura a mestrado, estudos para concurso e matérias desgastantes, que fizeram com que deixássemos este projeto em segundo plano. Não poderia deixar de mandar o meu agradecimento à professora Márcia, minha mais amada mentora, doutora e encorajadora.

Hoje, quase todos nós estamos formados e prontos para a retomada do projeto, com muito mais fome do que antes. O conhecimento adquirido só nos deu mais coragem para lutar por justiça no futebol – e fora dele. Nesse hiato ocorreu um golpe e uma mudança no cenário político nacional. Delações, escândalos e falcatruas que nos fazem temer o futuro.

Não podemos ficar parado. Que seja no formato de blog esportivo, mas que trate das questões sociais que o Ilegítimo teima em ignorar ou reduzir. Sigamos juntos.

 

José Eduardo
Subindo a Linha

Por mais Pelés e menos Edsons Arantes

Zito domina a bola. Passa para Pepe. Ele dribla dois, manda para Pelé, que corta a marcação e faz mais um para o Santos. Enquanto isso, Valdemar Carabina, Zequinha e Chinesinho articulam para tentar virar a partida para o Palmeiras. Santos 2. Palmeiras 0.

Na minha infância, não tão distante, me lembro de olhar a escalação do Cruzeiro e querer um dia ser igual ao Dida. Mas com a habilidade do Palhinha ou Alex e a raça do Cris. Apelidos comuns, que passam batido hoje, se não percebermos que fazem parte somente da cultura brasileira.

Internacionalmente, o sobrenome é coisa séria. Messi, Rooney, Suárez, Beckham. Todos conhecidos pelo nome de sua família. Há aqueles, inclusive, homônimos e ninguém sabe quem é quem. Só com muito estudo, consegui diferenciar quem eram os equatorianos Caicedo, atacante, do Caicedo, meia, e o Caicedo, zagueiro. Ou os colombianos Valencia. E os franco-africanos Diarra.

Mas no Brasil, a cultura é diferente. Leve, lúdica, despojada e brincalhona. Cada pessoa é una, e carrega consigo sua própria história. Ricardo Izecson Leite é o Kaká, nome carinhoso, de família. Para nós, representa muito mais quem ele é que “Leite”.

E os apelidos são a maior prova dessa nossa familiaridade com o futebol. É ver na tevê um jogo do campeonato turco e dar de cara com Bobô ou Vágner Love e saber que são brasileiros. São como nós, próximos de nós.

Hoje, o futebol é mais próximo do mundo empresarial. Cifras de dinheiro, etiqueta e bons modos nas arquibancadas, agradecimentos aos céus e jogadores ricos e desumanizados. Aquele Santos de Pelé, hoje conta com Lucas Lima, Victor Ferraz, Gustavo Henrique, Jean Mota e Ricardo Oliveira. Nome e sobrenome. Quase executivos.

Os nomes, no final das contas, pouco importam. Se é Dentinho ou Bruno Bonfim ou Dida ou Nelson Silva, tanto faz. Mas o que estes novos nomes compostos, pomposos, internacionais representam é a distância entre o torcedor e o jogador, mero trabalhador cuja profissão é jogar bola. O futebol não é mais do povo.

Por isso, clamo: mais Pelés, menos Edson Arantes.

Do nosso esporte, o mais “novo” esquadrão

Por Arthur de Souza

A ascensão do Sampaio Corrêa dentro do cenário nacional pode ser considerada como exceção, considerando o nível que se encontra o futebol maranhense. Desde 2012, a equipe vem subindo de série até chegar onde está, quinta colocação no Campeonato Brasileiro da série B.

Apesar de sua estrutura estar bem abaixo do que é considerado aceitável nos padrões nacionais, o “Tubarão ou Bolívia Querida”, como é chamado carinhosamente por sua torcida, consegue apresentar bom futebol, disciplina tática, preparo físico, etc., em praticamente todas as partidas.

Além disso, a diretoria entendeu a necessidade de buscar patrocínios pontuais, que compensam a falta de estrutura, como o Hospital São Domingos, que cuida dos atletas lesionados. Outra sacada, foi a criação do seu programa de sócio torcedor, o Sócio Torcedor Tricolor, que vem ajudando financeiramente o clube e também a sua bela torcida, que sempre aparece em bom número na maioria dos jogos realizados dentro de casa.

É lógico que ainda há muito trabalho a se fazer, porém não há dúvidas que todo o esforço feito para erguer novamente o Sampaio Corrêa Futebol Clube, é digno de aplausos, pois em um estado onde o incentivo ao esporte não é prioridade, o tricolor maranhense consegue ser destaque positivo, enchendo de orgulho todos os que torcem por um bom futebol.

Saudosa Maloca

José Eduardo

Operário, trabalhador, pobre. Sem condições de moradia, eu, Mato Grosso e Joca conseguimos uma terrinha pra morar. Algum tempo depois, derrubaram tudo. Como se fossemos invisíveis, ou talvez animais.

2015. O rico, talvez corrupto, o milionário. Com sua casa que parece um “aditício”, um edifício, uma mansão. E seus 1600 metros quadrados não são suficiente para abrigar a família. Deve haver um acesso ao Lago Paranoá. Finalmente, começa a derrubada. Mas a família desolada, que agora está com uma casa com apenas 7 quartos, sendo 5 suítes, não pode ter uma das paredes derrubadas. E está cessada a demolição.

Esta é a diferença de poder no Brasil. Saudosa Maloca é uma música de Adoniran Barbosa que explicita a dificuldade do pobre em ser respeitado. Invade terras e casa, é verdade, mas é tratado como um ex-escravo. Lembremos que quando da abolição da escravidão, em um distante 1888, os, agora ex-escravos, simplesmente ganharam a liberdade. Mas não tinham trabalho, moradia, instrução. É exatamente o que acontece com o pobre. Sem moradia, ele que se vire para procurar um lugar ao sol.

O rico, em contrapartida, é tratado com um rei, um lorde. Ele escolhe qual de suas paredes pode ser demolida. É tratado com respeito.

É com esse pensamento que a torcida do Corinthians, conhecido como o time do povo, bradou na despedida do seu antigo estádio: SAUDOSA MALOCA. O clube deixou o Pacaembu, que os abrigou por mais de 60 anos, para se alocar na Arena. A definição não poderia estar mais correta.

No Pacaembu, os ingressos eram populares, o povo abraçava o Coringão. Hoje, o rico domina a Arena. 45 reais é o ingresso médio. “Um aditício” faraônico em Itaquera para os moradores da zona sul.

Volte ao povo, Corinthians. Eu, Joca e Mato Grosso queremos gritar é campeão!
Ouça a música nas vozes dos Demônios da Garoa

À luz de um lampião

Por Vinicius Prado Januzzi

São Paulo, Brasil. Dia 01º de Setembro de 1910.

“20h30. À Rua José Paulino, esquina da Rua Cônego Martins, reúnem-se Anselmo Correa, Antonio Pereira, Carlos Silva, Joaquim Ambrósio, Raphael Perrone. E nasce o Sport Club Corinthians Paulista.”

O Corinthians foi fundado por operários. Por pessoas que nada tinham quando vieram para o Brasil e continuaram tendo ou muito pouco ou quase nada em suas vidas. Foi construído por pessoas que deixaram suas terras para nunca mais verem aqueles a quem mais amavam, pelos miseráveis da capital paulistana, por sapateiros, marceneiros, costureiros e acendedores de poste. Pelos inomináveis da época.

Esse é o Corinthians. Esse foi o Corinthians.

Neste aniversário de 105 anos do clube, que me levou a tantas alegrias e noites mal dormidas, é uma mensagem de retomada que deixo.

Todos os corinthianos e corinthianas já ouviram em suas vidas piadas sobre essa origem. Quando diante rebeliões em cadeias na televisão, o que se diz a um torcedor alvinegro? “Olha lá seus companheiros de arquibancada”. Quando o Corinthians disputa uma final, “impressionante como os assaltos diminuem nesses dias”. Sempre rimos das piadas, alguns outros ficam indignados, dizem que nossa renda no Itaquerão é imensa, que temos torcedores ricos também, que “eu mesmo nunca roubei, veja bem”.

Rir faz bem. Quase sempre. Nesse caso, ria mais. Porque sim, corinthianos, esse é o seu time.

Daqueles que estão presos, estão nas solitárias, daqueles que são perseguidos pela polícia e pelos patrões, muitas vezes eles mesmos companheiros de arquibancada. O Corinthians é esse time dos que recebem mal, aguentam desaforo e perdem horas e horas na condução que os leva e os traz do trabalho. É o time do barulho, dos invisíveis em massa, daqueles que ninguém gosta de ver e todos amam achincalhar.

É ou deveria ser? Eis a questão.

Infelizmente, não é esse nosso caminho de hoje.

Esquecemos, e principalmente esqueceram os que estão no comando do time, que esse é o Corinthians. O clube que mais cresceu quando menos ganhou, que ganhou na raça seu primeiro campeonato nacional há pouco mais de 20 anos,  que invadiu estádios adversários, fez dos cantos de outras torcidas meros complementos melódicos para seus gritos de guerra, o time antiditadura, o time, arrisco dizer, do povo.

O Corinthians foi, durante muito tempo, essa equipe. Muitas vezes ruim, sem nenhuma qualidade técnica, mas guerreira e quase sanguinária. Figuras entre os primeiros do nosso esporte bretão.

O time do povo, pelo povo e para o povo. O Corinthians deve, é claro, ter em suas fileiras torcedores endinheirados, daqueles bem tratados pela vida, moradores de bons bairros e passageiros em seus próprios carros. Agora, não devem esses ocupar o espaço do torcedor corinthiano com th nas veias.

O Itaquerão deve ser um templo, tomado por torcedores e torcedoras que inspiraram esse time, conduziram a equipe em nossa história, gritaram quando ninguém queria gritar, choraram e se desesperaram além do que podiam. Ver o estádio corinthiano impedir essas pessoas de levarem o time à frente não é só decepcionante, é historicamente vergonhosa. É escolher, na luta de classes, aqueles que a fundamentam. É fazer da bandeira de nosso passado uma (anti)lição para o nosso presente.

Nesse aniversário de 105 anos, Corinthians, que nos lembremos do que nos levou a ser altaneiros. Voltemos ao dia 1º de setembro de 1910, na companhia gloriosa de nossos eternos fundadores miseráveis. Voltemos a nossa história. Lembremo-nos de ser quem sempre fomos: Corinthians!

Para saber mais:

http://vejasp.abril.com.br/materia/corinthians-como-tudo-comecou

http://epoca.globo.com/vida/esporte/noticia/2015/08/elitizacao-do-futebol-ingresso-brasileiro-e-o-mais-inacessivel-do-mundo.html

Segue o jogo

Por Lucas de Moraes

O que? Quer dizer que um time que está brigando pra não cair no Brasileirão ganhou do seu rival que está no meio da tabela? Não acredito. Não acabou por aí, pois um alvinegro que luta pelo maior título nacional foi eliminado pra um time catarinense. Tem mais: no clássico paulista, o time do litoral, que estava na zona de rebaixamento há algumas rodadas, passou pelo líder do campeonato brasileiro. E, o mais inesperadamente, um time da capital do Brasil que não disputa nenhuma série do campeonato nacional derrotou um de série A.

Tá bom de emoção né? Esperemos até a próxima rodada. Talvez tenha mais.

E segue mais uma quinta-feira na história do futebol brasileiro.

Apita o árbitro e começa o jogo

Por Vinicius Prado Januzzi

Não é de hoje que a arbitragem no Brasil é questionada.

Em todos os campeonatos, em todas as fórmulas possíveis, em todos os anos desde que nos conhecemos como torcedores e torcedoras, jogos foram roubados, expulsões foram duvidosas, impedimentos foram ou não foram dados, faltas foram ou não forma marcadas, campeonatos foram comprados. Isso ocorreu? Sim.

Escândalos como a Máfia do Apito (2005) parecem ser a regra implícita de nosso futebol. A todos nós, basta só ir mais fundo em investigações e muitas falcatruas serão descobertas. Não importa que nada tenha sido posto a limpo ou mesmo provado. “Tem algo aí”.

Por ser corinthiano, talvez minha opinião já seja posta em dúvida de antemão. O Corinthians, seja verdadeiro ou não o que se diz, é conhecido como um dos times historicamente mais beneficiados no país. Não fossem os juízes, estaria torcendo em arquibancadas de alvenaria em algum estádio interiorano, no máximo em um campeonato regional de terceira divisão.

O problema da arbitragem no país, no entanto, está longe de ser uma questão de grandes conspirações e favorecimentos a determinado clube. Que o Corinthians tenha sido beneficiado em muitos jogos ao longo de sua história, dificilmente posso dizer que não, ainda que não possa trazer nada que comprove esse grande esquema. O mesmo em relação aos outros clubes brasileiros e sulamericanos.

Por esse e muitos outros motivos, não adianta comparar lances e mais lances, fazer colagens em cima de colagens com exemplos de jogos recentes ou do início da história, comparar aquele ou esse impedimento quando não se leva em conta como funciona a arbitragem no Brasil. Por funcionamento, falo de formação, de salários e de progresso na carreira. Ambos estão conectados e no modo como se conjugam no país nos permite entendem um pouco mais do quadro caótico do que é ser juiz/a brasileiro/a de futebol.

Você já parou para se questionar como é que se forma um árbitro no Brasil? Quanto recebe, em média, uma apitadora? Quanto tempo é necessário para que juízes apitem jogos de alto nível ou mesmo sejam escalados para apitar Copas do Mundo ou outras competições internacionais? No geral, essas não são perguntas que fazemos, embora suas respostas, a meu ver, impactem diretamente no pênalti não marcado para o São Paulo contra o Corinthians no Campeonato Brasileiro desse ano (09/08/2015) e no gol validado do Chapecoense contra o Atlético Mineiro (16/08/2015)

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No Brasil, a profissão de árbitro de futebol é regulamentada desde 2013, após a promulgação da lei 12.867/2013. No dia a dia, nada muda. O juiz que você vê na TV todo domingo continua como um prestador de serviços à Confederação Brasileira de Futebol. Ao apitar o Brasileirão ou a Libertadores, por exemplo, o juiz é cedido pela Federação Estadual/Distrital à qual está vinculado. Quem o contrata, portanto, é a Federação. Daí deduzimos que ela paga aos árbitros os direitos trabalhistas previstos na legislação e que estipula rendimentos fixos, complementados por honorários por jogos apitados. Errado.

Juízes recebem tão só e unicamente por jogo que apitam. Quanto mais avança na carreira, mais avança na média de ganhos por partida. Uma vez no topo dessa jornada e se chegar até esse Olimpo, vai arcar com as despesas relativas à formação, à nutrição, ao preparo físico e muitas vezes de locomoção e hospedagem. Um árbitro FIFA que apita um jogo de série A ganha 3.500 reais por partida. Parece muito, mas não é.

Se levarmos em conta os rendimentos relacionados ao futebol, o valor logo fica desproporcionalmente pequeno. Os árbitros FIFA são, ainda, uma minoria irrisória no país. Comparar seus ganhos aos do grande parte dos outros juízes é o mesmo que comparar o salário do atacante sãopaulino Pato com o que ganha Waguininho, do Oeste de Itápolis. Árbitros recebem pouco em relação ao futebol como um todo e a própria distribuição de rendimentos na categoria é desigual, muito desigual. Se comparado o Brasil a outras ligas nacionais, a coisa fica ainda mais complicada (http://espn.uol.com.br/noticia/535901_brasileiro-tem-o-pior-salario-entre-juizes-das-grandes-ligas-do-mundo-compare).

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Considerados todos esses problemas, entre muitos outros que poderiam ser apontados – a questão do rodízio dos árbitros e a quase exclusiva presença de homens entre os juízes profissionais, por exemplo -, não fica difícil afirmar que a má qualidade da arbitragem no Brasil está longe de ser uma questão de competência individual ou de uma orquestração muito safada construída em reunião secreta realizada no CT Joaquim Grava, com a presença do senhor José Maria Marin, do ilustre Ronal Rhovald e do anfitrião Roberto de Andrade.

Mais do que suspostos juízes desonestos e dirigentes corruptos, com certeza presentes no universo futebolístico, o que temos em campo são juízes mal preparados, mal pagos e mal formados. Os erros que cometem com seu time, portanto, não têm o carinbo alvinegro, tricolor ou rubronegro. Têm o carimbo da CBF, a mesma das camisetas de domingo último.

Para saber mais:

http://espn.uol.com.br/post/535822_cbf-nao-tem-arbitros-para-o-brasileirao

http://esporte.ig.com.br/futebol/2014-10-10/com-minoria-privilegiada-arbitros-dizem-que-salario-baixo-prejudica-desempenho.html

http://espn.uol.com.br/noticia/535901_brasileiro-tem-o-pior-salario-entre-juizes-das-grandes-ligas-do-mundo-compare

http://blogdoperrone.blogosfera.uol.com.br/2010/10/quanto-ganha-um-arbitro-no-brasileirao/