Apita o árbitro e começa o jogo

Por Vinicius Prado Januzzi

Não é de hoje que a arbitragem no Brasil é questionada.

Em todos os campeonatos, em todas as fórmulas possíveis, em todos os anos desde que nos conhecemos como torcedores e torcedoras, jogos foram roubados, expulsões foram duvidosas, impedimentos foram ou não foram dados, faltas foram ou não forma marcadas, campeonatos foram comprados. Isso ocorreu? Sim.

Escândalos como a Máfia do Apito (2005) parecem ser a regra implícita de nosso futebol. A todos nós, basta só ir mais fundo em investigações e muitas falcatruas serão descobertas. Não importa que nada tenha sido posto a limpo ou mesmo provado. “Tem algo aí”.

Por ser corinthiano, talvez minha opinião já seja posta em dúvida de antemão. O Corinthians, seja verdadeiro ou não o que se diz, é conhecido como um dos times historicamente mais beneficiados no país. Não fossem os juízes, estaria torcendo em arquibancadas de alvenaria em algum estádio interiorano, no máximo em um campeonato regional de terceira divisão.

O problema da arbitragem no país, no entanto, está longe de ser uma questão de grandes conspirações e favorecimentos a determinado clube. Que o Corinthians tenha sido beneficiado em muitos jogos ao longo de sua história, dificilmente posso dizer que não, ainda que não possa trazer nada que comprove esse grande esquema. O mesmo em relação aos outros clubes brasileiros e sulamericanos.

Por esse e muitos outros motivos, não adianta comparar lances e mais lances, fazer colagens em cima de colagens com exemplos de jogos recentes ou do início da história, comparar aquele ou esse impedimento quando não se leva em conta como funciona a arbitragem no Brasil. Por funcionamento, falo de formação, de salários e de progresso na carreira. Ambos estão conectados e no modo como se conjugam no país nos permite entendem um pouco mais do quadro caótico do que é ser juiz/a brasileiro/a de futebol.

Você já parou para se questionar como é que se forma um árbitro no Brasil? Quanto recebe, em média, uma apitadora? Quanto tempo é necessário para que juízes apitem jogos de alto nível ou mesmo sejam escalados para apitar Copas do Mundo ou outras competições internacionais? No geral, essas não são perguntas que fazemos, embora suas respostas, a meu ver, impactem diretamente no pênalti não marcado para o São Paulo contra o Corinthians no Campeonato Brasileiro desse ano (09/08/2015) e no gol validado do Chapecoense contra o Atlético Mineiro (16/08/2015)

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No Brasil, a profissão de árbitro de futebol é regulamentada desde 2013, após a promulgação da lei 12.867/2013. No dia a dia, nada muda. O juiz que você vê na TV todo domingo continua como um prestador de serviços à Confederação Brasileira de Futebol. Ao apitar o Brasileirão ou a Libertadores, por exemplo, o juiz é cedido pela Federação Estadual/Distrital à qual está vinculado. Quem o contrata, portanto, é a Federação. Daí deduzimos que ela paga aos árbitros os direitos trabalhistas previstos na legislação e que estipula rendimentos fixos, complementados por honorários por jogos apitados. Errado.

Juízes recebem tão só e unicamente por jogo que apitam. Quanto mais avança na carreira, mais avança na média de ganhos por partida. Uma vez no topo dessa jornada e se chegar até esse Olimpo, vai arcar com as despesas relativas à formação, à nutrição, ao preparo físico e muitas vezes de locomoção e hospedagem. Um árbitro FIFA que apita um jogo de série A ganha 3.500 reais por partida. Parece muito, mas não é.

Se levarmos em conta os rendimentos relacionados ao futebol, o valor logo fica desproporcionalmente pequeno. Os árbitros FIFA são, ainda, uma minoria irrisória no país. Comparar seus ganhos aos do grande parte dos outros juízes é o mesmo que comparar o salário do atacante sãopaulino Pato com o que ganha Waguininho, do Oeste de Itápolis. Árbitros recebem pouco em relação ao futebol como um todo e a própria distribuição de rendimentos na categoria é desigual, muito desigual. Se comparado o Brasil a outras ligas nacionais, a coisa fica ainda mais complicada (http://espn.uol.com.br/noticia/535901_brasileiro-tem-o-pior-salario-entre-juizes-das-grandes-ligas-do-mundo-compare).

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Considerados todos esses problemas, entre muitos outros que poderiam ser apontados – a questão do rodízio dos árbitros e a quase exclusiva presença de homens entre os juízes profissionais, por exemplo -, não fica difícil afirmar que a má qualidade da arbitragem no Brasil está longe de ser uma questão de competência individual ou de uma orquestração muito safada construída em reunião secreta realizada no CT Joaquim Grava, com a presença do senhor José Maria Marin, do ilustre Ronal Rhovald e do anfitrião Roberto de Andrade.

Mais do que suspostos juízes desonestos e dirigentes corruptos, com certeza presentes no universo futebolístico, o que temos em campo são juízes mal preparados, mal pagos e mal formados. Os erros que cometem com seu time, portanto, não têm o carinbo alvinegro, tricolor ou rubronegro. Têm o carimbo da CBF, a mesma das camisetas de domingo último.

Para saber mais:

http://espn.uol.com.br/post/535822_cbf-nao-tem-arbitros-para-o-brasileirao

http://esporte.ig.com.br/futebol/2014-10-10/com-minoria-privilegiada-arbitros-dizem-que-salario-baixo-prejudica-desempenho.html

http://espn.uol.com.br/noticia/535901_brasileiro-tem-o-pior-salario-entre-juizes-das-grandes-ligas-do-mundo-compare

http://blogdoperrone.blogosfera.uol.com.br/2010/10/quanto-ganha-um-arbitro-no-brasileirao/

Sobre vpjanuzzi

Escrevo como meio de vida. Escrevo como meio de diversão. Escrevo também como um fim em si mesmo.

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