2019, o ano em que cancelei meu sócio-torcedor

Bicampeão da Copa do Brasil, bicampeão mineiro. 2019 começou da melhor forma possível para o Cruzeiro. Plantel mantido, reposição de Arrascaeta com Pedro Rocha, Fred voltando de lesão e sendo artilheiro estadual. Parecia mais um ano em que teria orgulho do azul celeste. Ledo engano.

Ao longo de minha vida, o Cruzeiro me acompanhou. Em minha ignorância, estava no Mineirão naquele Cruzeiro 3 x 0 Grêmio que praticamente selou nosso tricampeonato brasileiro, em 2013. A quem não se recorda, a Raposa havia sido punida com perda de mando de campo para aquela peleja. Foi então que os então senadores Aécio Neves e Zezé Perrella interferiram politicamente no parlamento e conseguiram a anulação da sentença na CBF, em discussão regada a sabe-se lá o quê.

Neste dia, nem mesmo minha viagem Brasília-BH, nem os aplausos aos senadores na entrada de campo me fizeram enxergar que ali havia algo errado. No ano seguinte, Neves candidatou-se a presidente com maciço apoio institucional cruzeirense a sua campanha.

Em 2014, final da Copa do Brasil. Novamente, viajei 800 km e paguei a bagatela de R$280 o ingresso para ver uma das maiores vergonhas da história celeste. A derrota em campo para nosso maior rival não se compara à tristeza que senti quando vi o Mineirão vazio em um dos maiores jogos da nossa história. Mais de R$7 milhões de renda para menos de 40 mil torcedores. O setor central, de frente às câmeras de TV, vazio. Mas ainda resisti e continuei sócio.

Nem mesmo quando zeraram todos os meus Cruzeiros, programa de fidelidade do clube que dá pontos para que você troque em benefícios, me fizeram cancelar o sócio. Ainda que eu tenha juntado por 6 anos, morando a 800 km de distância da cidade sede do clube.

Em 2019, entretanto não consegui me abster. Durante todo o ano, Wagner Pires de Sá, Itair Machado, Sergio Nonato e seu grupo de extermínio aniquilaram meu amor pelo Cruzeiro. O primeiro incidente veio em diversas oportunidades. Durante várias campanhas a favor dos direitos das mulheres e inclusivos a LGBTQI+, o Cruzeiro se absteve enquanto grande parte dos clubes brasileiros se posicionaram.

Mais precisamente, no dia 28 de junho, dia do orgulho LGBTQI+ e no dia 17 de maio, dia internacional contra a homofobia , Vasco, Grêmio, Internacional, Botafogo-RJ, Botafogo-PB ABC, Remo, Bahia, Paysandu, Figueirense, Santa Cruz, Fortaleza, Sport, Fluminense, Corinthians, Náutico, Bangu, América-MG, Santos, Bahia, São Paulo e o próprio Mineirão se posicionaram, com artes e compartilhamentos nas redes sociais valorizando a inclusão de todos no esporte. O Cruzeiro ignorou as datas.

No dia 30 de agosto, todos os clubes da série A organizaram uma campanha de combate à homofobia dentro e fora dos estádios. A iniciativa conta com uma imagem com o mesmo texto, adaptada`às cores do clube. Nele consta: “Pior que prejudicar seu clube é cometer um crime. Grito homofóbico não é piada. Muito menos cântico de torcida. Grito homofóbico é crime, dentro e fora dos estádios. Diga não à homofobia! Uma campanha dos clubes brasileiros”.

Apenas um clube compartilhou imagem diferente, obviamente o Cruzeiro Esporte Clube. Em sua arte, expressava-se: “Torcedor, homofobia é crime. Qualquer grito prejudica o clube. Diga não à homofobia! Uma campanha dos clubes brasileiros”. Enquanto na arte dos outros 19 clubes, homofobia seria “pior que prejudicar seu clube”, para o Cruzeiro, o foco se baseou no prejuízo à instituição.

Minutos depois, o Cruzeiro emitiu um tuíte corrigindo a arte e compartilhando a mesma que a distribuída pelos demais clubes. De fato, ou o clube pouco luta contra a homofobia, se não a corrobora, ou a diretoria é extremamente amadora. Ou os dois.

Os incidentes seguintes demonstram o fim do Cruzeiro. Em reportagem feita pela Rede Globo, denúncias mostram como o clube vendia passes de jogadores de forma corrupta, assinava e revendia passes de crianças, supervalorizava salários e tantas outras questões já tão abordadas em outros canais e, por isso, não me alongarei neste tema.

Estes são os motivos pelos quais, quando o Cruzeiro foi eliminado pelo Internacional na Copa do Brasil, eu não chorei. É por isso que não vejo mais jogos do clube com assiduidade. Não declaro meu amor, não ajo com orgulho nem tampouco viajo para ver as partidas do amor da minha vida até 2019. Ainda sou cruzeirense, mas, após 6 anos, não sou sócio, nem apaixonado. Espero, um dia, voltar a ser.

José Eduardo Cruz Vieira

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