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Sobre língua castelhana e transfusões de sangue

Arthur Siqueira

O ano é 2005. Em certo jogo da Final de um certo Mundial Interclubes, o meio campista de um certo time inglês adversário recebe a bola praticamente livre e avança em direção à meta de um certo goleiro artilheiro. Em sua cabeça, passa-se o filme dos momentos seguintes: ele avançaria em direção à baliza, driblaria o goleiro com facilidade e finalizaria com uma bomba no ângulo direito. Gritos da torcida, manchetes de jornais, glória. Antes do filme chegar aos créditos, algo o atinge por trás com uma força descomunal, arremessando-o alguns metros a frente e destruindo as ambições que haviam sido construídas em sua cabeça.

O zagueiro era Diego Lugano, e aquele lance, na metade do segundo tempo, definiu a maior virtude daquele São Paulo campeão mundial: o sangue nos olhos. Naquele momento, Lugano poderia facilmente ter sido expulso e o Tricolor seria esmagado com a desvantagem de um jogador importantíssimo aliada à clara superioridade técnica do time do Liverpool, mas na cabeça de Lugano, aquilo pouco importava. Ele sabia que tinha um dever como zagueiro: evitar o gol do time adversário. E isso deveria ser feito a qualquer custo. E ele foi lá e impediu. Tomou um amarelo que não avermelhou por muito pouco, e seguiu o jogo soberano na zaga. Aquilo era um São Paulo realmente vencedor. Jogadores não tão técnicos, como Aloisio e Edcarlos, mas que jogavam com garra e odiavam o sabor da derrota.

O retrato do time são-paulino hoje em dia é exatamente o contrário. O elenco é qualificadíssimo. Diversas estrelas, com salários astronômicos e nomes tão pesados que poderiam criar um campo gravitacional ao seu redor. Mas ao contrário daquele time que o torcedor tricolor tanto sente saudades, sobra qualidade e falta garra. Falta gana de vencer, falta a náusea causada pelo sabor da derrota. Jogadores como Paulo Henrique Ganso, um primor de técnica, um dos mais talentosos meias da geração brasileira mais recente, mas que não se dá o trabalho de correr atrás de uma bola perdida, dão a cara desse São Paulo atual.

Briga sozinho no meio de um mar de morosidade e conformismo o mito Rogério Ceni, que é mito e será para sempre no coração do são paulino justamente por ser o último que sente a dor da derrota. Que sai de campo xingando a puta que pariu o juiz por uma derrota. Que como um médico que tenta desfibrilar o paciente mesmo bons minutos depois de sua morte, tenta colocar algum sangue na veia de jogadores claramente sem vontade de estar ali suando a camisa do São Paulo. Sem sucesso algum, como se pode ver no comportamento dos jogadores.

Esse é o maior desafio de qualquer um que ouse vestir o agasalho de técnico do São Paulo. Fazer um grupo vencedor saber que eles estão infestados pela mediocridade. Que mesmo tendo vencido quase todos os jogos em casa, isso não basta para ser campeão, pra colocar sorriso na boca do torcedor na segunda feira e encher estádio na quarta. Essa missão hoje está na mão de Juan Carlos Osorio, colombiano que veio em uma tentativa da diretoria de fazer algo diferente do que é o futebol e os técnicos brasileiros atualmente.

Uma árdua tarefa para quem está no comando de um clube que se tornou cada vez mais soberbo e sem alma com o tempo, e que acumula vexames e mais vexames nos momentos em que o torcedor mais se alegraria com a vitória. Alguém que mostre ao time que não está tudo bem em brincar com o adversário após uma eliminação, e que se não for jogar por amor ao São Paulo, que jogue por gratidão à torcida que o apoia e que chora com a sua derrota.
A meta de Osorio tem que ser tornar o São Paulo mais Lugano, menos Ganso. Mais carrinho no Gerrard, menos risadinha na saída do campo depois de perder clássico. A língua eles já têm em comum, resta saber agora se o coração e a capacidade de contagiar o time com o tesão pela vitória são parecidos. Está nas mãos de Osorio fazer bater o coração do time do São Paulo, e colocar um pouco de sangue em olhos que não brilham pela vitória.

Quero ver gol

Vinicius Prado Januzzi

Há pouco tempo aqui no Subindo A Linha, meu colega Pedro Abelin comentou sobre o início da Copa do Mundo de Futebol Feminino. O noticiário esportivo, com raras exceções (e eu falo isso como recurso estilístico, porque imagino que o negócio é pra lá de feio mesmo), veicula o torneio por obrigação moral, ou digamos assim, por expiação de consciência. É, é futebol, logo divulgamos, mas é futebol feminino, então…matérias de um minuto ou dois.

Mais surpreendente do que essa faceta extremamente grotesca é outra ainda pior. “Conheça as jogadoras que encantam (dentro e fora de campo)”, “As mais belas jogadoras por seleção nessa Copa do Mundo”, “Bola dentro! Veja as beldades que desfilam em campo.” Seria cômico, não fosse trágico.

Claro que podemos analisar esse fenômeno sob diferentes óticas. Podemos dizer que não é só o jornalismo que é sexista e estúpido, mas que a sociedade é, as pessoas em geral o são, logo os jornais e as mídias só produzem algo que é comercializável, que atrai público, que, enfim, possibilita renda.

Também podemos dizer que não é nada disso, que seja quem seja essa sociedade, claramente machista, o jornalismo de larga escala poderia se opor a essa tendência e produzir materiais de boa qualidade, ressaltando o futebol feminino pelos gols, pelas jogadas, pelas defesas e pelas táticas. Poderíamos ir mais além: jornalistas de todo o mundo, falem da política voltada ao futebol feminino, comentem sobre as políticas de exclusão, sobre os salários risíveis e sobre as precárias condições de trabalho. Engajem-se contra isso.

Há outros que dizem que não há problema nenhuma nessa cobertura. É o jeito como as coisas são; mulher joga bola, mas tem bunda, logo vejo os dois. Se ela está querendo se mostrar dessa forma e eu querendo vê-la assim, que mal há em ambos exercemos nossas liberdades e seguirmos nossos desejos?

Essas questões, é claro, não são reservadas ao mundo das boleiras e dos boleiros. Você já deve ter ouvido falar de Ana Cláudia Lemos, velocista brasileira. Ana Cláudia é medalhista do ouro dos Jogos Pan-Americanos de 2011, atual recordista brasileira sul-americana nos 100 metros rasos e é conhecida, sobretudo, por sua forma física. Em matéria risível de 2011 (http://globoesporte.globo.com/programas/globo-esporte/noticia/2011/05/musa-do-atletismo-promete-chamar-atencao-no-gp-de-uberlandia.html), o GloboEsporte nos brindou com a seguinte manchete: “Musa do atletismo promete chamar atenção no GP de Uberlândia. Além de ser a velocista mais rápida do Brasil, a atleta Ana Cláudia Lemos ostenta medidas bem distribuídas”. Acho que nem preciso argumentar onde se encontram os problemas dessa frase.

Temos uma velocista extremamente competente. Temos uma seleção feminina das melhores do mundo. Nosso time de handebol feminino foi o último campeão mundial. Contra tudo e contra todos, frise-se. Para a mídia esportiva, predominantemente masculina (infelizmente esse blog ainda é composto só por homens), e para o público televisivo, talvez importem outros atributos de nossas atletas. Sem apontar causas e efeitos com relação a essa postura cruelmente machista, porque imagino que o problema é de retroalimentação homicida, ofereço um desafio. Na próxima vez, entre uma bunda e um gol, veja o gol. Veja a atleta, a campeã, a heroína do esporte. Veja o sacrifício e a superação. Em alto e bom som, digo: eu quero ver gol!

Roma x Lazio: o clássico que divide a capital italiana

totti

O derby della Capitale, como é conhecido esse clássico, na visão de muitos ex-jogadores e jornalista é a maior rivalidade da Italia. Apesar dos clubes de Roma não gostarem dos times do Norte, representados por Inter, Milan e Juventus. O ódio que existe entre eles é muito maior, pois existe uma questão ideológica que divide as torcidas. O clássico se tornou tão expressivo, que segundo a IFFHS (Federacao Internarnaional de Historica e Estatistica do Futebol) e outros meios de comunicação, foi eleito o segundo maior clássico do futebol mundial.

A Lazio foi fundada em 1900 por integrantes do exército italiano. Já a Roma surgiu como um projeto do Partido Nacional Fascista, o objetivo era levar o nome de Roma para o resto da Europa por meio do futebol e conseguir vencer os clubes do Norte. Três clubes se uniram para formar a Roma. A Lazio era para ser uma dessas equipes, mas por causa de um membro influente do exército italiano, torcedor fanático da Lazio, este nao foi incluído. Um fato curioso é que apesar da origem da Roma, o clube ao longo dos anos se tornou o clube do proletário e muito ligado com a esquerda romana, ao passo que a Lazio estava alinhada com a direita, defendendo por vezes o nazismo e reproduzindo discursos racistas.

A tensão do clássico é extrema e episódios de confusão foram constantes ao longo da historia. O principal caso foi em 1970, quando um torcedor da Lazio, Vincenzo Paparelli, foi morto apos ser atingido por um sinalizador. Foi o primeiro episódio de morte no futebol italiano. Todos os jogadores da Lazio compareceram ao enterro do torcedor e depois foi realizado um amistoso entre jogadores de Lazio e Roma para homenagear Paparelli. Apesar de todos os esforços, a torcidas continuam se odiando e a violência continua forte. Esse clássico é o maior da Itália.

O final da década de 90 e o início do segundo milênio foram períodos muito importantes para ambos os times. Roma e Lazio conseguiram montar times poderosos com jogadores como Cafu, Batistuta e Emerson de um lado e Nedved, Simeone, Stankovic, Veron, Mancini, Marcelos Salas e Nesta do outro. Cada clube conquistou um título italiano nesse período. Em meio a esses grandes jogos, a Lazio conseguiu aplicar, em 98, a maior goleada da sua história contra a Roma, ganhando por 4 a 1.

Depois de 84 anos de clássico, em 2013 Lazio e Roma protagonizaram a final da Copa da Itália. E o sorteio feito no inicio do torneio colocou como o estadio da final o Olimpico de Roma, a casa de ambas as equipes, como não poderia ser diferente. Foi a primeira final entre essas equipes na história e ocorreu em Roma, com o estadio dividido, a capital dividida e foi a Lazio quem copou o torneio. O jogo foi a 1 a 0 com gol de Senad Lulic, um dos maiores triunfos laziales.

Foram 172 jogos ao longo da história. A Roma possui 63 vitórias e a Lazio 49. O artilheiro do confronto é Dino da Costa e o jogador que mais disputou o classico foi o ídolo da Roma Francesco Totti, com 36 partidas.

El Loco